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Desigualdade, corrupção e revolta com “nepo kids”: entenda a crise no Nepal

  • Foto do escritor: Neriel Lopez
    Neriel Lopez
  • 12 de set.
  • 4 min de leitura

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A sede do parlamento foi queimada, o primeiro-ministro renunciou e multidões invadiram e queimaram casas e carros de autoridades do governo, enquanto a repressão às manifestações matou ao menos 25 pessoas e prendeu mais de 600. Afinal, o que está acontecendo com o Nepal, nação do Sudeste Asiático com cerca de 32 milhões de pessoas. A história política do país é marcada por lutas contra o autoritarismo, mas até os especialistas ficaram surpresos com os últimos acontecimentos.


“Nepo kids”

A expressão “nepo kid” é usada globalmente como crítica a filhos ou herdeiros de pessoas influentes, poderosas ou apenas famosas que se aproveitam de suas situações privilegiadas para abrir portas em suas carreiras ou simplesmente fazer ostentação financeira. No Nepal, esses “filhos no nepotismo” são a próxima geração da classe política no poder, que constantemente vão às redes sociais mostrar roupas novas ou viagens ao exterior. Isso num país no qual o PIB per capita é de US$ 1,4 mil (cerca de R$ 7,8 mil) anuais e onde cerca de 20% dos jovens estão desempregados. A exposição dos “nepo kids” se alastrou como pólvora a partir de redes como o Tik Tok.


Proibição de redes sociais

O “remédio” encontrado pela classe política do Nepal contra essas viralizações que tinham como alvo seus filhos foi o bloqueio das plataformas de mídia social, para reprimir o que eles consideravam notícias falsas e incitação aos discursos de ódio. Desde a eleição de 2022, o governo já vinha fazendo críticas ao fato de as mídias sociais não serem regulamentadas no país, o que reduzia o acesso igualitário às plataformas para as campanhas políticas. E, a exemplo, do que ocorre em vários países – como no Brasil – há pedidos para que big techs nomeiem um escritório ou uma pessoa de ligação no país, para a responsabilização adequada em caso de excessos. Mas o projeto de lei adotado não foi suficientemente debatido no Congresso, o que levou a fortes críticas de entidades que defendem o direito de livre expressão.


Escalada de protestos

Os protestos contra as medidas se intensificaram na última segunda-feira (8), quando confrontos com a polícia mataram ao menos 19 pessoas. No dia seguinte, o primeiro-ministro K.P. Sharma Oli renunciou ao caro, mas isso não arrefeceu os ânimos. Especialmente na terça-feira, a violência explodiu nas ruas da capital Katmandu. A multidão invadiu e incendiou prédios públicos e passou a perseguir políticos nas ruas e em suas casas, com várias cenas de espancamentos sendo transmitidas pelas redes sociais. A esposa do ex-primeiro-ministro Jhalanath Khanal, por exemplo, sofreu queimaduras graves quando os manifestantes incendiaram sua casa e está internada em uma UTI. Alguns integrantes das lideranças da “Geração Z”, interessados em participar das negociações de um novo gabinete, passaram a declarar que os protestos legítimos foram usados por grupos radicais. Há no país um toque de recolher, com tropas nas ruas.


De onde vêm as críticas?

O descontentamento de parte da população vem de longa data por conta da lentidão de cumprimento de promessas de melhora na governança do país, que em poucas décadas saiu da era da monarquia para a da república, sem conseguir no entanto mudar muito a condição social das pessoas. O Nepal enfrentou uma guerra civil entre 1996 a 2006, após o Partido Comunista do Nepal (de vertente maoísta) lançar uma rebelião armada contra a monarquia. A insurgência maoísta terminou com a assinatura de um acordo de paz abrangente em novembro de 2006, levando à abolição da monarquia e ao estabelecimento de uma república democrática federal no Nepal dois anos depois. Mas o país já teve 14 governos em vigor desde a transição para a democracia parlamentar. A coalizão que estava no poder, de centro-esquerda, tinha um acordo com partidos menores para alternar o governo até 2027. Mas avaliação de analistas era que essa união continuava ameaçada pelas rivalidades e ambições pessoais de seus líderes, determinados a preservar sua influência.


E a corrupção?

Mesmo com as mudanças políticas nas últimas décadas, a corrupção entre funcionários do governo – principalmente a concessão de licenças e aprovações e contratos públicos para bens e serviços – continua a ser um problema. Para quem não têm conexões em altos cargos, os subornos continuam sendo uma forma comum no país de se obter acesso a serviços públicos ou até mesmo realizar atividades comuns, como conseguir uma carteira de motorista ou uma certidão de nascimento.


Como está a economia?

O Nepal tem algumas ineficiências e fraquezas, como o fato de ser um país sem litoral, portanto dependente dos portos indianos. Também tem escassez de infraestrutura, uma cesta de exportação pouco diversificada e com dependência forte da agricultura (21% do PIB, 35% das exportações e 61% do emprego). Além disso, tem uma elevada dívida pública, equivalente a 89% do PIB, e um caso extremo de evasão fiscal. Ainda assim, o Banco Mundial tem elogiado o crescimento econômico do Nepal nos últimos anos. Essa aceleração ocorreu apesar dos desastres naturais e interrupções no turismo — inundações e deslizamentos de terra nos últimos anos causaram danos equivalentes a 0,8% do PIB, impactando severamente a infraestrutura, a agricultura e os serviços sociais. A inflação geral do país diminuiu para 5% no acumulado de 12 meses até junho de 2025, ante 6,5% no mesmo período de 2024, atingindo teto da meta.


(Fontes: Banco Mundial, Coface, Índice de Transformação Bertelsmann – BTI, Al Jazeera, AP, Reuters, CNN) e Infomoney

 
 
 

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